Antecedentes Históricos

Fatores que determinaram a imigração suíça

A fundação de Helvetia, em 1888, só foi possível e só pode ser entendida se nos reportarmos ao ano de 1854. Foi neste ano que 26 famílias, num total aproximado de 150 pessoas, procedentes do Cantão de Obwalden, na Suíça, chegaram ao Brasil para trabalhar na Fazenda Sítio Grande, propriedade do Sr. Antonio de Queiroz Telles, no  Município de Jundiaí.
Em meados do século passado a Europa Central vivia momentos de crise econômica e social resultante das guerras napoleônicas e dos movimentos sociais que reivindicavam mudanças nas instituições e nas estruturas da sociedade. Esta crise foi particularmente acentuada na Suíça, agitada internamente pelas lutas entre os cantões conservadores católicos e os liberais de maioria protestante. A guerra do Sonderbund em 1847 significou o enfraquecimento político e cometam econômico para os cantões da Suíça Central entre eles Obwalden. Neste mesmo período, aqui no Brasil, diante do movimento abolicionista, recorreu-se à colonização estrangeira com o objetivo de substituir, pouco a pouco, o braço escravo na lavoura de café e de povoar o país, então com baixa densidade demográfica.

Sistema de colonização adotada no estado de São Paulo:

Não havia, quer entre os governantes, quer entre os fazendeiros, consenso sobre o melhor sistema de colonização. Alguns defendiam a formação de núcleos de colonização através da concessão de terras aos imigrantes, financiados pelo Estado, como aconteceu em Santa Catarina e Rio Grande do Sul, com resultados satisfatórios. Outros, principalmente os fazendeiros do Estado de São Paulo, eram contrários à concessão de terras aos imigrantes. Assim dizia o Senador Vergueiro, grande fazendeiro paulista: “Não estamos em estado de tomar tanto peso sem utilidade correspondente. Chamar colonos para fazê-los proprietários à custa de grandes despesas é uma prodigalidade ostentosa que não se compadece com o apuro das nossas finanças”.
A proposta dos fazendeiros era o sistema de parceria. Foi o que prevaleceu para os imigrantes de Obwalden. As cláusulas fundamentais do contrato de parceria eram: os colonos eram contratados na Europa e trazidos para as fazendas de café. Tinham sua viagem paga, assim como o transporte até as fazendas. Essas despesas, entretanto, entravam como adiantamento feito ao colono pelo proprietário, assim como, igualmente, lhe era adiantado o necessário à sua manutenção, até que ele pudesse se sustentar pelo próprio trabalho. A cada família deveria ser atribuída uma porção de cafeeiros, na proporção da sua capacidade de cultivar, colher e beneficiar. Aos colonos também era facultado o plantio, em certos locais predeterminados pelo fazendeiro, dos mantimentos necessários ao seu sustento. Em caso de venda desses víveres, ao fazendeiro reservava-se a metade. Vendido o café, o fazendeiro se obrigava a entregar ao colono a metade do lucro líquido. Sobre as despesas feitas pelo fazendeiro em adiantamento aos colonos, eram cobrados juros de 6%, a contar da data do adiantamento, ficando os colonos solidariamente responsáveis pela dívida e aplicando-se na sua amortização, pelo menos, metade dos seus lucros anuais.
O colono, além de se obrigar a cultivar e manter o café, e “a concorrer em comum com o serviço correspondente à quantidade do café entregue para o trabalho que o mesmo exige até entrar no mercado”, devia conduzir-se disciplinadamente. Não podia abandonar a fazenda sem ter previamente comunicado, por escrito, sua intenção de retirar-se, e só o poderia fazer após saldar todos os seus compromissos. Em caso de dúvidas ou pendências entre os contratantes era indicada à autoridade judicial local para decidir o dissídio (2).
Análise do Sistema de Parceria:

As colônias formadas sob o sistema de parceria se concentravam nas regiões de Limeira, Campinas, Jundiaí, Taubaté, Ubatuba, Rio Claro, Amparo, Pirassununga, Capivari e Mogi Mirim. Os colonos eram procedentes de diversos países da Europa, principalmente, Portugal, Espanha, Alemanha e Suíça. Os suíços se concentravam principalmente nas vizinhanças de Jundiaí, Limeira, Rio Claro e Piracicaba’. A maior parte destas colônias foi fundada entre 1852-1854.
Nos primeiros anos da implantação do sistema de parceria era grande a satisfação dos fazendeiros. Mas ela durou pouco, menos de dez anos. “A maior parte dos fazendeiros tivera sérias dificuldades com os seus colonos, estava descontente, muitas vezes ansiosa por se livrar deles”.

As queixas dos fazendeiros eram de diferentes tipos: modos brutais que os colonos usavam ao fazerem suas exigências; a agitação em que viviam; a indisciplina e os maus costumes de muitos deles, tendo alguns sido presos, o desleixo na colheita, juntando grãos de café verdes e maduros; a recusa a executar certas tarefas, chegando mesmo a se negar a construir cercas para a própria pastagem, só o fazendo mediante indenização; a preguiça e o vício da bebida o que os tornava desordeiros e violentos; a baixa produtividade; a recusa a cuidar do cafezal depois de terminada a colheita etc.
Se os proprietários estavam decepcionados com a experiência, não menos estavam os colonos. Além de não encontrarem, no Brasil, o paraíso prometido pela propaganda das Companhias que os contrataram, reclamavam que as mercadorias de que necessitavam eram vendidas por preços maiores do que valiam; que lhes eram atribuídos os cafezais pouco produtivos, ainda em formação ou velhos e mirrados, reservando-se o fazendeiro os melhores pés que entregava ao trabalho escravo. Reclamavam ainda dos pesos e medidas usados pelos fazendeiros e seus representantes, que, segundo diziam, avaliavam a mercadoria sempre em prejuízo dos colonos. Apontavam como desonesta a contagem de juros e os cálculos da conversão da moeda. Queixavam-se ainda os colonos do peso excessivo das dívidas que caíam sobre eles, já ao chegar à fazenda, em virtude do preço da viagem e transporte até a sede, muitas vezes distante do Porto de Santos, onde eram desembarcados. Sobre aqueles preços ainda eram cobrados juros.
Thomas Davatz chega a dizer que os colonos sujeitos a este sistema de parceria não passavam de “pobres coitados, miseravelmente espoliados, de perfeitos escravos, nem mais nem menos” e que encontravam, às vezes, maior dificuldade em se libertar do que os próprios “pretos”. Falavam da arbitrariedade dos senhores, que tolhiam os movimentos dos colonos. Criticavam o desconforto das casas de pau-a-pique, sem forro, em chão batido, a lembrar as senzalas. Denunciavam o caráter mesquinho das somas em dinheiro que recebiam por mês (dois, cinco e, excepcionalmente dez mil réis) o que tornava obrigatório comprar na fazenda, dada a impossibilidade de realizá-las fora. Ficava assim o colono amarrado aos preços do fazendeiro e enredado num sistema de dívidas cada vez mais difíceis de serem pagas.

Estas queixas de ambos os lados parece evidenciarem o insucesso do sistema de parceria e a precariedade das relações de trabalho na grande maioria dos casos.
Um pouco diferente foi a experiência em Sítio Grande, segundo vários testemunhos históricos (4). As cláusulas dos contratos de parceria eram as mesmas, as condições de vida, de habitação e de trabalho também. Parece ter sido outra, entretanto, a forma de dar cumprimento a elas. “Poucos devem ter sido os fazendeiros que, como Antonio de Queiroz Telles, de Jundiaí, entregavam aos colonos os cafeeiros em pleno vigor de produção, e aos escravos os cafeeiros mais velhos” afirma Avé Lailemant e o confirmam von Tshudi e Davatz (5). O mesmo afirma Weitzinger baseado no testemunho dos próprios colonos ou dos seus descendentes.

Sítio Grande era um conjunto de várias fazendas de propriedade de Antonio de Queiroz Telles, o Barão de Jundiaí. Mais tarde, quando da sua morte, em 1870, feita a partilha entre seus filhos, as partes em que foi dividida passaram a ser denominadas com o homônimo de seus proprietários. Surgiram, desse modo, as fazendas S. Luis, S. Francisco etc…

Os antecedentes:

Nas terras de Sítio Grande instalaram-se, em 1854, as 26 famílias dos imigrantes pioneiros. A viagem de Hamburgo a Santos, num navio à vela, demorou 73 dias. Em alto mar morreram 35 pessoas, na maioria crianças, e, nos primeiros tempos na fazenda, outras 24. Este fato é por demais eloqüente para merecer comentário. Durante 34 anos lá permaneceram os pioneiros nas condições de vida e de trabalho descritas acima. Vida rude, simples e pobre, circunscrita ao trabalho e à família. Nem todos resistiram às adversidades da situação. Segundo relato dos antigos, apenas oito das 26 famílias sobreviveu (6).

Até 1881 nenhum outro contingente de imigrantes veio se juntar àquele grupo inicial. A partir desta data, até 1888 outros colonos procedentes de Obwalden, muitos deles parentes dos pioneiros, imigraram para a mesma fazenda. As condições de vida já eram melhores, as dívidas já tinham sido pagas, alguns já tinham ascendido a postos de responsabilidade na administração da fazenda, alguma poupança já tinha sido feita, de modo a permitir que algumas famílias já tivessem adquirido sítios ou fazendas na região, abandonando a antiga e precária condição.

Se a condição de vida dos colonos de Sítio Grande tinha melhorado, o mesmo não acontecia com a situação geral do País. A crise econômica e política anunciavam a queda do Império e a Proclamação da República. Não cabe aqui a discussão das razões que determinaram a mudança de regime, mas apenas alguns fatos que de alguma forma ir iam propiciar uma mudança radical na vida dos colonos suíços no Estado de São Paulo.